José Pedro Frazão
Políticos
e poetas não são iguais, nem se parecem, apesar de concorrerem em habilidade no
trato de palavras persuasivas. Nem mesmo com a insinuação do verso de Fernando
Pessoa que propõe ser o poeta “um fingidor”, porque as dores e fingimentos que
os dois apresentam não têm a mesma origem nem o mesmo fim. O poeta finge “a dor
que deveras sente.”
Afora a
coincidência da primeira sílaba de político e poeta, a semelhança que se nos
apresenta é uma miragem em que a “Última Flor do Lácio”, fingindo-se de
“inculta”, mas “bela”, se rende às malícias de ambos. É como se fossem o
maribondo e a abelha, que sugam a mesma
flor, mas não produzem o mesmo mel.
Que não
se arme contra mim o ferrão do marimbondo político, mas é verdade que há uma
questão de gênero: o poeta direciona sua malícia para o verbo; o outro, quase
sempre, para a verba, com justa razão de sobrevivência, porque, na atualidade,
verbo e verba são respectivamente alimentos naturais de um e de outro. Mas nada
impede um político de ser poeta, para melhor entender as utopias; nem um poeta
de ser um gestor público, para governar com sensibilidade e concretizar as
utopias sociais.
Ao utilizar
a arte poética visando à verba, o político invoca Autólico (o ícone mitológico
da esperteza, da desonestidade). E ao se locupletar o poeta da arte do verbo
para fins escusos é porque ele já não é mais – ou nunca foi – um poeta. É um
simples marimbondo possuído por Sísifo (o ente mitológico mais astuto dos
mortais, mestre da malícia e dos truques, que chegou a enganar a própria
morte).
Imaginem,
hoje, uma antologia de politerários brasileiros:
1 - um
vereador “clássico” legislando ao estilo greco-romano, mas em causa própria, cegando
Camões, dramatizando
Shakespeare e zombando Cervantes;
2 - um
“romântico” presidente do senado corrompendo Byron e assassinando Álvarez de
Azevedo e a ética, tecendo fantasias e sentimentos para negar a verossímil
propina de Sísifo e sustentar uma história de amor impossível (na mitologia
grega, Autólico também era o ladrão que roubava o gado de Sísifo);
3 - um deputado
caindo no grampo “realista” da polícia federal e na contradição “naturalista”
do “jogo” do poder, preferindo Maquiavel a Machado de Assis;
4 - um “parnasiano”
governador avesso a Bilac, deixando o cargo sem explicar o golpe aplicado ao
erário, perdido em formas e palavras difíceis de aceitar, fazendo o remendo
ficar pior que o soneto;
5 - um “simbolista”
(ou simbólico) presidente nacional imortalizando chavões do futebol e
derrotando a Educação (na contramão de Pitágoras) e com o subjetivismo de
causar inveja a Cruz e Souza;
6 - um pseudomodernista
líder venezuelano, mais podre que maduro, plagiando o socialismo de Gabriel
Garcia Márquez, querendo ser a “chave” da questão latino-americana, com o risco
de impingir-lhe mais “cem anos de solidão”.
Não dá certo. Político é político; poeta é
poeta. Em cada dez políticos pode haver um poeta; em cada dez poetas, pode
haver um político. Nem todo político é político; nem todo poeta é poeta. É como
a poesia: de cada dez livros publicados, um contém alguma poesia; os demais são
versos perdidos na ilusão que a arte não criou. Da mesma forma, os habilidosos
manipuladores de verbos e verbas, discípulos de Sísifo e Autólico, são, na
linguagem vulgar, políticos e poetas caça-níqueis, que somente aí se
assemelham, porque não são nem políticos, nem poetas.
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